***RUI BARBOSA***

***RUI BARBOSA***
"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto." (Senado Federal, RJ. Obras Completas, Rui Barbosa. v. 41, t. 3, 1914, p. 86)
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terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Os abutres estão chegando

Gastos calculados no chute mostram o caráter
 leviano dos nossos governantes
O centro de Friburgo  certamente não era "área de risco"
 “Não é apenas mais uma tragédia, essa de proporções inimagináveis, já considerada até por respeitáveis órgãos internacionais, como “a maior da nossa História”. É a catástrofe da imprudência oficial, do descaso, da desatenção, do descuido e da cumplicidade”.
Hélio Fernandes
Teresópolis ainda nem havia enterrado seus mortos e o prefeito Jorge Mario Sedlacek (PT) já calculava em R$ 590 milhões o dinheiro federal necessário para “reconstruir” a cidade.
De onde essa soma? Em três dias, quando muitas áreas atingidas ainda não haviam sido alcançadas, nenhum gênio seria capaz de fazer estimativas. Mas o prefeito Jorge Mário Sedlacek já tinha os números na ponta da língua.
Por quê? Quem acompanhou a reunião da presidente Dilma Rousseff com as autoridades locais, inclusive o governador, noticiou que ela se sentiu incomodada pela insistência com que esse prefeito e o colega Paulo Mustrangi, de Petrópolis, seus correligionários, falavam em dinheiro rápido para gastar na emergência.
A hora da onça beber água
Os dois estimam que somente nos seus municípios, e em Friburgo, serão necessários; de cara, R$ 2 bilhões, ou quatro vezes mais do que havia no Orçamento Federal em 2010 para obras preventivas em todo o país.
Para facilitar a apropriação de recursos, autorizando seu uso sem controle ou restrição, o governador oficial, Sérgio Cabral, decretou estado de calamidade em sete municípios afetados pela chuva.
Daqui para frente, como é do script, os governantes procurarão inventariar “o que pode ser feito para resolver a situação das pessoas atingidas”, como declarou Luiz Fernando Pezão, governador de fato, espelhando o mais explícito improviso, marca da incompetência ampla, geral e irrestrita que campeia em nosso país.
Haverá uma guerra de políticos lobistas para colocarem na fita as empreiteiras que contribuíram para suas campanhas – por dentro e por fora. A rede de interesses escusos já deve estar dando as cartas, como é de lei.
Não foi por falta de aviso
Há farta documentação sobre o descaso das autoridades, em todos os níveis, apesar das informações repassadas sobre os riscos existentes em toda a região serrana do Estado do Rio.

Um estudo encomendado pelo próprio governo fluminense já alertava, desde novembro de 2008, sobre o risco de uma tragédia na região serrana - como a que ocorreu na última segunda-feira e que já deixou mais de 600 mortos. A situação mais grave, segundo o relatório, era exatamente em Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo.
Essas cidades tiveram, historicamente, o maior número de deslizamentos de terra. O estudo apontou a necessidade do mapeamento de áreas de risco e sugeriu medidas como a recuperação da vegetação, principalmente em Nova Friburgo, que tem maior extensão de florestas.
É claro que o levantamento foi superado pela verdade nua e crua da tragédia. Com certeza, não constavam das áreas de risco o centro de Nova Friburgo, o Instituto Politécnico da UERJ (onde no passado funcionou a admirável escola da FGV) os bairros de veraneio de Teresópolis, cada dia mais inchados pela especulação imobiliária, e o haras do Jóquei Clube em Petrópolis, fortemente atingidos.
Não será exagero dizer que os esses estudos tornaram-se questionáveis a partir de tamanhos estragos. Agora já se fala com mais ênfase no tipo de solo vulnerável dos municípios atingidos, oferecendo um quadro em que, à falta de um projeto de escoamento efetivo, ninguém por ali pode se sentir a salvo da violência de lamas em alta velocidade. Isto é, na prática, as próprias estradas asfaltadas e sem drenagem servem de leitos para as águas dos temporais. E olha que são rodovias “pedagiadas”, onde você morre numa grana preta para passar por elas.
Corpo de delito da classe política
A catástrofe que ainda vai ter muitas consequências dramáticas poderia pelo menos servir de lição para os governantes.
Mas já não há homens públicos vocacionados. Um parceiro lembrou que, á frente do Ministério de integração, o titular, Geddel Vieira Lima, candidato ao governo da Bahia, canalizou para lá 60% dos recursos federais, e ficou por isso mesmo.
Quem vê essa guerra suja por qualquer fatia do poder não pode esperar nada de novo no front. Na década de 60, duas inundações no antigo Estado da Guanabara levaram à criação do Instituto de Geotécnica e da própria Defesa Civil.
Hoje, duvido que se pense em qualquer estratégia de prevenção. Apesar da sua magnitude acusadora, esse não foi o primeiro grande desastre natural em nosso Estado e em nosso país.
A sucessão de explosões da natureza já faz parte de uma rotina macabra que desafia a imperícia dos governantes de baixa estatura política.
O que aconteceu agora é o mais saliente corpo de delito de uma classe política indigna, que recorre a todo tipo de truque e a expedientes sórdidos para acessar os cofres gordos de um poder público desfigurado, privatizado, costurado ao gosto de um valhacouto do que há de mais desprezível na sociedade brasileira.
Essa malta que deita e rola, que só está lá para se dar bem, infelizmente, é a expressão escabrosa de nossa festejada democracia representativa.

Para ganho fácil não há áreas de risco
A insistência dos prefeitos de Teresópolis e Petrópolis em pôr a mão no dinheiro, em qualquer dinheiro, para as despesas de emergência que calculam no chute, levianamente, não causa mais espanto.
Enquanto a população procura na solidariedade incansável amenizar o sofrimento das vítimas e até mesmo purgar o seu descuido na escolha dos governantes, os abutres querem saber é por onde tirarão seus ganhos das facilidades oferecidas pela situação de calamidade configurada, de fato, no desespero generalizado, e de direito, no decreto do governador.
Daqui a pouco, a catástrofe sairá da mídia e se transformará numa pálida lembrança de um povo acostumado a tais infortúnios na mansidão cultivada conforme os hábitos e costumes destes dias mal inspirados.
Os abutres sabem que para suas incursões insaciáveis não há áreas de risco. Afinal, vivem num país onde reinam os picaretas, encastelados nas fortalezas do Estado e nos seus anexos terceirizados, fruindo de um ambiente de tal promiscuidade que amaldiçoa como inconveniente quem não reza por sua cartilha.
Que as vítimas da tragédia não se culpem amanhã por terem servido de carniça para a rapinagem dos abutres.
E que um dia renasça dos escombros a consciência crítica que tanta falta faz a todos nós.
                                     
Por E-mail de: Dr. José Eduardo Bruno

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