***RUI BARBOSA***

***RUI BARBOSA***
"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto." (Senado Federal, RJ. Obras Completas, Rui Barbosa. v. 41, t. 3, 1914, p. 86)
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sexta-feira, 3 de junho de 2011

LUTO

Foto: Internet

“ANTURA”

            Lendo a edição nº 707  (20 a 26/05/2011) do jornal Beira-Rio, encontrei uma nota da família de Augusto Boaventura Guimarães Frech, o “Antura” e me surpreendi com a notícia de seu passamento. “Antura” não era político, não era figurão na cidade. Era apenas um bom amigo de muitos e conhecido e querido de um monte de gente. Eu o tinha no mais alto conceito e o conhecia de longa data. Por isso resolvi escrever umas linhas sobre ele, contando alguns dos muitos momentos que convivemos juntos. Foi pelas mãos dele que conheci Visconde de Mauá, onde morava uma tia dele (não consigo lembrar o nome dela), casada com o folclórico Sr. Constantino, motorista do caminhão leiteiro de Mauá. Dizem que ele só dirigia bem naquela sinuosa estrada se tivesse tomado “uma” e que quando estava de “cara limpa”, sempre acontecia um imprevisto. E foi na carroceria desse leiteiro, no meio e encima dos latões de leite que subi a serra pela primeira vez. Devia ter uns 15 ou 16 anos. Uma viagem inesquecível. Saímos de Resende à tardinha de um dia de céu limpo e azulado. Ficou marcada na minha memória, o encantamento com as paisagens que vi naquele dia. Nunca tinha visto nada semelhante. Parecia que estávamos num avião, voando por entre as poucas nuvens que ficaram abaixo de nós, tentando esconder as casinhas que diminuíam de tamanho à medida que subíamos. Hospedamo-nos na casa do Constantino, dormimos num quarto que tinha no sótão da casa (que existe até hoje e é uma das atrações da vila), nadamos nas gélidas e límpidas águas do Rio Preto e passeamos ao amanhecer pelos campos do vilarejo, tomados por uma neblina fantástica. Devia ser inverno. No dia de voltar, encontramos o Constantino no boteco, “entornando mais uminha só...” pra descer a serra. E nada de anormal aconteceu, tanto na ida como na volta. Meses após esse passeio, formamos a primeira banda de rock de Resende: “Os Fantásticos” (que era pra ser com “K”). Pioneirismo de que só nos daríamos conta muitos anos mais tarde. A banda começou com Roberto Vasconcelos na guitarra rítmica, Moacirzinho na guitarra solo (um craque. Muito conhecido como o Rei do Cavaquinho. Era anão!), eu no contrabaixo (na realidade um violão velho com “cristal”), Adonai Silva no acordeom (depois uma pianola que “imitava” um órgão), Chiquinho Muratori na percussão (Pandeiro sem couro) e na bateria: “Antura”. Ensaiávamos na garagem da casa do Roberto, que era filho do professor de História na AMAN, Heitor Jorge de Vasconcelos. Roberto era o dono do conjunto. A maioria dos instrumentos era dele. Nos dias de ensaio, a calçada da garagem ficava cheia. E nós ali, arrebentando as goelas e cordas. Um dia, o Odilon Farias, que já tinha programa na Rádio Agulhas Negras, envia um convite para uma entrevista “ao vivo” na rádio. Ficamos meio apavorados e decidimos que iríamos apenas eu e o Vasconcelos. Fizemos a tal entrevista com fundo musical (Beatles) dedilhado pelo Roberto. Na sequência, fomos convidados para tocar no “Parada da Alegria” do Aloísio “Simplício” Braz. Foi nossa primeira apresentação oficial em público. E novamente “ao vivo”. Dessa vez, com o grupo completo. Sucesso total. Fizemos também um show em Cruzeiro (SP) que nos deixou mais conhecidos ainda. Um dia conto como foi esse show. Tudo isso pra chegar na minha saída do conjunto. O Antura era um gozador de primeira linha, e gostava de “perturbar” a turma com suas brincadeiras. Me chamava de “Nandinho” (saudades). Num dia de ensaio “de porta fechada”, o Antura resolve “pegar no meu pé”. Me perturbou tanto, mas tanto, mas tanto que... Quebrei o vilão nas costas dele e disse pro Roberto que nunca mais voltaria. Eles até tentaram, mas mantive minha palavra e não voltei mais. O conjunto sobreviveu fazendo bailes até final dos anos 1970, ou início dos 80. Não guardei mágoa nem fiquei inimigo do Antura ou de qualquer componente da banda. Muito pelo contrário. Apenas saí do conjunto. Só mais uma pra finalizar. Nossa “turma” ficava sempre ali na “Bomboniere Vitória” do seu Hely Balieiro, ao lado do Cine Vitória. Era o “point” da cidade junto com o Bar Atlântico (Da Dodô). Ali fazíamos um semicírculo e eu gostava de ficar encostado na parede de mármore do Vitória pra conversar fiado, comentar sobre o filme... O Antura chega de supetão e me pega de jeito: Me acertou um chute perfeito no meio das pernas, bem lá!!! Perdi o fôlego. Caí com uma dor insuportável. E abana daqui, abana dali, pega água no bar “Meu Cantinho” (ao lado da entrada da rádio), eu “puxando” o ar que não vinha... Finalmente, alguns minutos depois a coisa foi passando e o Antura me pedindo desculpas, dizendo que não era pra acertar e coisa e tal... Eu apenas lhe disse, calmamente: “Vai ter volta”. A partir daquele momento ele começou a ficar “cabreiro” comigo. Quando estávamos em rodinha, ele procurava ficar longe de mim. Um dia lhe disse: “Não precisa se preocupar Antura, fica sossegado. Quando tiver que ser, será”. Ele começou a namorar a Virgínia, filha do “Seu” Brito da TV-Lar (Jorge Rocha Brito). E aí, um namora de cá, outro de lá, casa um daqui, outro dali e aquele grupinho de amigos foi se dispersando. Um belo dia chega a notícia: O Antura vai casar! Dias depois encontrei com eles. Perguntei se era verdade, e ele todo alegre, de mãos dadas com ela, confirmou. Nos abraçamos, desejei felicidades e ele: “Mas você vai ao casório, num vai?”. “Claro que vou meu amigo, evidente!”. E chegou o dia. Igreja Matriz muito bem ornamentada, repleta, todo mundo lá. A recepção foi num clube. Um festão daqueles. Na hora dos cumprimentos, beijei e abracei a noiva, dei um forte abraço nele e lhe cochichei ao ouvido: “Vai ser hoje, antes de vocês saírem pra lua de mel...”. Ele me olhou espantado e perguntou o que ia ser hoje? Respondi: “Bomboniere Vitória, eu sem ar, lembra?”. “Pô Nandinho, faz tanto tempo...”. Não respondi nada, apenas me afastei e fiz um sinal de positivo com o polegar. Coitado do Antura. Ele me conhecia, sabia que eu era um sujeito de palavra. Passou a festa me procurando. Eu, de farra, fazia de tudo pra ele não me ver. De vez em quando, no meio do povo, eu lhe acenava, ele me respondia, meio aliviado. Eu sumia de novo e ficava olhando-o de longe, a me procurar pelos lados, e principalmente por trás. Quando o casal estava se retirando para o carro que os levaria para a lua-de-mel, cercado pelas amigas da noiva, eu surgi na frente dele... Ele ficou estático, branco, e eu em voz alta lhe disse: “Felicidades amigo, vai com Deus!”.  E saí dando gargalhadas. Muitos anos depois nos reencontramos quando eu morava nos Vale das Flores (Mirantão-MG) e eles tinham um sítio em Santo Antonio, também em Minas. Esteve lá em casa um par de vezes. Numa dessas, me confidenciou que se eu tivesse retribuído o chute no saco no dia do ocorrido ou dias depois, teria sido melhor do que os momentos de angustia que passou no dia do casamento.
Rimos muito disso tudo e de muitas outras histórias.
Fica em paz, meu amigo! Qualquer hora a gente se vê aí por cima...

Fernando Lemos – 25/05/2011 (01:12h)

Nota: Publicado na edição nº 709 (03/06/2011)  do jornal "Beira Rio" . Clique aqui para ler no jornal.
        

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